Advogada especialista em Direito Tributário responde questões sobre o funcionamento
do clube e futuras contratações caso o processo seja aprovado pela Justiça
Justamente no ano de seu centenário, o Avaí Futebol Clube pegou seus torcedores de surpresa ao anunciar, na última segunda-feira (17), um pedido de recuperação judicial junto ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC). Com uma dívida acumulada em mais de R$ 107 milhões, a diretoria culpou os juros altos na dificuldade para equilibrar as contas. Dessa forma, uma assessoria jurídica e financeira foi contratada para elaborar o plano de ação financeiro, que deverá ser finalizado em até 2 meses.
Porém, o que é uma recuperação judicial e como o processo funciona? A medida já foi solicitada por grandes empresas brasileiras, como a Oi, a Samarco e a Ricardo Eletro. Recentemente, a Americanas teve seu pedido aprovado após caso emblemático. O Portal TVBV conversou com a advogada Fernanda Luz, Especialista em Direito Tributário, para entender os detalhes desse tipo de processo.
A recuperação judicial
Regulamentada pela Lei nº 11.101/2005 (e complementada pela Lei nº 14.112/2020) a recuperação judicial é uma medida que visa evitar que a empresa vá a falência completa com a crise financeira. Fernanda Luz explica que “o procedimento tem como objetivo reunir todos credores da empresa [quem empresta dinheiro ou concede crédito ao clube], para que haja um acordo de pagamento eficaz. Em suma, o objetivo principal é tornar a empresa saudável novamente, com todos os credores quitados, e apta para retornar as suas operações”.
Com relação ao quadro de funcionários, não há correlação direta com futuras demissões, pois, segundo Fernanda, a recuperação judicial promove “uma maior segurança aos sócios, a manutenção dos empregos dos funcionários, dos prestadores de serviços e de todas as pessoas ligadas a essa empresa”. Em pronunciamento da última segunda-feira (19), a diretoria do Avaí afirmou que os funcionários estão com salários em dia.
Atividades do clube
Caso seja aprovado, o Plano de Recuperação Judicial do Avaí poderá ter validade de até dois anos para que o clube cumpra com todas as obrigações previstas. Nesse meio tempo, de acordo com Fernanda, as atividades da empresa tanto devem continuar funcionando normalmente quanto não podem cessar.
“Diferentemente do que ocorre que a Ação de Falência, na Recuperação Judicial os sócios podem continuar na gestão do negócio, porém eles serão supervisionados por um administrador judicial, nomeado pelo juiz logo no início da ação, que deve zelar pelos interesses dos credores e também preservar a recuperação da empresa” relata.
Novas contratações
Não, o Avaí não será impedido de contratar novos jogadores ou demais funcionários. Contudo, Fernanda Luz, especialista em Direito Tributário, considera que qualquer ação para assumir novos contratos e investimentos devem ser feita “com vigilância dobrada”.
“Caso haja atraso no pagamento de salários, durante o procedimento de execução da recuperação judicial, e a manobra for contrária ao estipulado no plano de recuperação, a falência poderá ser decretada. Então, poderá ser feita a contratação de novos jogadores, mas não é o mais inteligente a se fazer”, declara.
“A grande questão gira em torno de ter passivo disponível para realização de contratação e investimento, já que a empresa está em crise financeira e recorreu ao Poder Judiciário para tornar-se rentável novamente. Nesses casos, geralmente, o clube mantem o seu efetivo de jogadores para conseguir fazer o pagamento dos salários”, completa Fernanda.
Próximo passo
Fernanda Luz explica que o processo de recuperação judicial possui diversos requisitos legais para ser viabilizado. São eles: empresa ativa e registrada na Junta Comercial por ao menos 2 anos; Não ter ingressado com outro processo de recuperação judicial nos últimos 5 anos; Não ter obtido concessão de plano especial de recuperação judicial nos últimos 8 anos; Não ter nenhuma responsabilidade remanescente de processos anteriores de falência; Não ter sido condenada ou ter como sócios ou controlador pessoa condenada por qualquer crime previsto na lei falimentar.
Preenchidos os requisitos, o pedido deve ser protocolado na Justiça e deve conter:
- Os motivos que levarem a crise financeira;
- As demonstrações contábeis dos últimos 3 anos;
- O detalhamento de todas as dívidas em aberto;
- A relação patrimonial dos sócios.
Com o aceite do pedido pela Justiça, deverão ser suspensas por 180 dias as obrigações de pagamento do clube. Ao mesmo tempo é também nomeado um administrador judicial para acompanhar a empresa.
Passados 60 dias, o clube deverá apresentar um plano detalhado, com uma proposta de pagamento de dívidas e todo o caminho que pretende percorrer para viabilizar o pagamento. Assim, está prevista também a livre negociação entre o clube e os credores a fim de criar um ambiente favorável entre as partes.
Após a elaboração do plano, é necessária a aprovação de maioria simples dos credores (50% + 1) para que a recuperação judicial seja realmente concedida. Em caso de rejeição, a proposta pode ser refeita em até 30 dias.
Desafios no futebol
Em época de clubes-empresa e cada vez mais debates acerca da saúde financeira dos times de futebol, algumas questões são cruciais para equilibrar as contas na dinâmica do esporte. De acordo com Fernanda, “o principal desafio tributário de clubes de futebol é realizar uma estratégia para conseguir uma menor incidência de tributo”.
“Acredito que para isso acontecer o clube sempre deve estar amparado por uma equipe de advogados especialistas, que consigam fazer um bom planejamento de acordo com as possibilidades financeiras e fiscais do clube. Não tem como um clube de futebol sonegar imposto para tentar diminuir a taxação. Isso tem que ser feito dentro da lei”, finaliza a advogada.
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